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Dignidade menstrual

  • Foto do escritor: gritaprojeto
    gritaprojeto
  • 25 de out. de 2021
  • 3 min de leitura

Por Laura Costa


Enquanto a política for desenhada pelos mesmos rostos de sempre, direitos básicos como o de menstruar serão ignorados. E que rostos são esses?


Rostos de homens, brancos, heterossexuais. Rostos diferentes dos nossos que representam o imaginário político de sempre.



No último dia 07 de outubro acordamos com a notícia de que o presidente Bolsonaro vetou partes fundamentais do Projeto de Lei que visava garantir a distribuição gratuita de absorventes para mulheres de baixa renda no Brasil. O projeto é de autoria da deputada Marília Arraes (PT) e foi construído com apoio da bancada feminina da Câmara dos Deputados, tendo sido aprovado nessa casa legislativa e, em seguida, no Senado. Antes de falar sobre esse veto que chega a ferir a alma, vamos compreender porque essa temática é tão importante e urgente.


Os dados não mentem: 23% das brasileiras de 15 a 17 anos NÃO têm acesso a produtos de higiene pessoal. Uma em cada quatro brasileiras já faltou a aula por não poder comprar absorvente! Das 60 milhões de pessoas que menstruam no Brasil, 1,5 milhão não têm banheiro em casa (saneamento básico é luxo para mais da metade da população desse país até hoje). O ano é 2021 e mulheres ainda usam miolo de pão e jornal por não ter dinheiro para comprar absorvente, o que as deixa mais vulneráveis à infecções e doenças ginecológicas graves. Dados como esses nos demonstram que essa é uma política pública necessária no âmbito da educação, da saúde e dos direitos humanos.


O governo Bolsonaro apresentou uma justificativa completamente equivocada e mentirosa para tentar justificar o veto. Em um primeiro momento argumentou que o projeto não deixava claro o embasamento orçamentário, não mencionando de onde viria o recurso para tal. No entanto, o projeto deixa claro isso. O PL indica claramente em seu texto que os recursos viriam do FUNPEN (Fundo Penitenciário) para os itens a serem distribuídos para mulheres e meninas cumprindo medidas socioeducativas, e do SUS para meninas e mulheres em situação de rua ou estudantes da rede pública. Além disso, no projeto há uma previsão para que recursos da educação também possam ser utilizados para a compra e distribuição de absorventes nas escolas públicas. A estimativa é de um investimento total de R$ 84 milhões por ano para atender cerca de 6 milhões de meninas e mulheres, prevendo, ainda, uma economia de atuais gastos do SUS com tratamento de infecções e cirurgias por conta do uso de materiais inapropriados no lugar dos absorventes.


O presidente argumentou, ainda, que o projeto atenta contra o interesse público. Aqui fica claro os interesses que Bolsonaro está preocupado, ignorando sem a menor preocupação, o interesse de mais da metade da população brasileira representada pelas mulheres. Por fim, no que se refere ao financiamento do SUS, Bolsonaro disse que o PL contraria o princípio de universalidade do SUS.


No Brasil, a saúde é direito de todos e dever do Estado. Simples assim. Está previsto na Constituição Brasileira, que, em seu artigo 196, dispõe que esse direito é garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem a redução do risco de doença e o acesso universal e igualitário às ações e serviços para proteção e recuperação.


Se o SUS distribui preservativos em postos de saúde e isso atende ao princípio da universalidade, por que a distribuição de absorventes não cabe aí? Esse argumento de Bolsonaro representa desconhecimento e deslealdade ao princípio do SUS, distorcendo o conceito para servir aos interesses do (seu) público e não da maioria do povo brasileiro.


Os absorventes, no Brasil, são tributados de maneira parecida com outros itens cosméticos e são considerados, dentro dessa lógica, uma espécie de “bem supérfluo”. Precisamos mudar urgentemente essa lógica: absorvente não é luxo e menstruar é direito básico. Não é possível que alguém mesmo se deparando com todas essas estatísticas cruéis tenha coragem de dizer que isso é LUXO!


Segundo a pesquisadora Lilian Lopes, do Laboratório da Pobreza, é possível afirmar que a pobreza menstrual, além de causar os já esperados impactos negativos na escola, no trabalho e na sociabilidade dessas mulheres, impacta também no nível de felicidade das mesmas, impactando no Índice de Felicidade do país.


Precisamos exigir do Congresso Nacional a derrubada desse veto que é um retrocesso contra os direitos das mulheres. A luta contra a pobreza menstrual enfatiza, ainda mais, a necessidade de mais mulheres na política. De espaços mais representativos, de vozes que realmente possam ecoar os nossos direitos. Precisamos, urgentemente, caminhar na luta por novos imaginários políticos possíveis. Se tudo é política, se nosso corpo é político, por que outros corpos alheios às nossas necessidades deveriam nos representar?


Que reconfortante é ter esse espaço para gritarmos juntas por nós e por todas. Exigimos liberdade e dignidade para menstruar: absorvente na cesta básica JÁ!










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