Giovanna Macieira Rosário
Era dia da mulher quando me deparei com uma discussão sobre menstruação. Já repararam como esse simples processo biológico exclusivo do sexo feminino é tratado como algo imundo e errado?
Eu, por exemplo, quando fiquei menstruada pela primeira vez fui acometida por uma terrível sensação de vulnerabilidade misturada com vergonha. Eu tinha treze anos, estava de férias da escola e costumava descer para o pilotis do prédio para brincar com as outras crianças, em sua maioria meninos. Pois bem, naquele dia eles me chamaram para descer e brincar, mas eu não fui. Na realidade, passei os próximos cinco dias trancada em casa, me sentindo envergonhada e errada. E como moro no primeiro andar, escutava os meninos brincando, mas me recusava a ir brincar também. Minha mãe tentava me convencer a descer, a me juntar às outras crianças, mas eu não queria sair de casa por nada neste mundo.
Olha que loucura, o que faz uma menina de treze anos se sentir constrangida diante de um processo biológico? É como se o universo estivesse jogando na sua cara: “se deu mau otária, nasceu mulher, agora aguenta que tá só começando”. É como se fosse um presságio da amargura que te aguarda: “fica esperta, moça”. Mas e se fossem os homens que menstruassem e não as mulheres? A menstruação também seria tratada como algo sujo ou como um simples processo biológico? Nem um, nem outro.
Se os homens menstruassem, a menstruação provavelmente seria encarada como um sinal divino, uma indicação de valentia e força. Provavelmente haveria competições entre os meninos sobre quem possui o fluxo mais intenso e o vencedor seria o líder da turma. Quando o menino descobrisse que menstruou, ele correria ao telefone para ligar para o pai que, na cultura latina, organizaria um evento chamado initiation sanguine - do latim: sangue de iniciação - seria como um Bar Mitzvá, mas não restrito aos judeus, e os meninos receberiam presentes em dinheiro por terem finalmente menstruado.
Se fossem os homens que menstruassem, provavelmente aprenderíamos nas aulas de história sobre como na Idade Média eram realizados rituais com sangue de menstruação masculina para garantir uma boa colheita ao feudo; ou sobre como na antiguidade os guerreiros romanos passavam sangue de menstruação no rosto antes de seguir para o campo de batalha, a fim de garantir força e coragem.
Se fossem os homens que menstruassem, os meninos levantariam a mão no meio da aula e diriam à professora: "Professora, posso ir ao banheiro? Estou menstruado”. E um colega já iria logo dizendo “não é só você que tá menstruado não, João. Eu também estou”. Não, eles não fariam como as meninas que sentem vergonha da menstruação e escondem o absorvente debaixo das mangas do moletom da escola para poder ir ao banheiro trocá-lo. Os absorventes voariam de um lado ao outro da sala de aula “Ei, Bruno, tem absorvente aí?”, gritaria um dos meninos. E o Bruno lançaria o absorvente para que todos na sala vissem.
Se fossem os homens que menstruassem, os absorventes certamente seriam distribuídos pelo Estado, a fim de garantir o direito à higiene menstrual a todos os homens. Mas bom, não são os homens que menstruam… E em função disso, no Brasil, mulheres pobres perdem dias de trabalho por não terem acesso a absorventes que, em um cenário onde a política é dominado por homens, não é tratado como item básico de higiene. Em função disso, no mundo, uma em cada dez meninas falta à escola durante a menstruação. Ai, se ao menos os homens menstruassem, não teríamos de lutar para garantir uma dignidade tão básica.
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