por Danny Mendes
“[...] Se me quer no job paga meu cachê!”
Iza Sabino, N.I.N.A, Thamiris - Paz Terrível
“Estou em contato com o pessoal do [...] vamos ver se ela topa participar voluntariamente.... e tanto sua presença, como a dela podem abrir oportunidades de trabalho, já que temos pessoas de [...], entre outros que podem sim vir a contratar vocês. Geralmente são três expositores que se apresentam voluntariamente. Você compartilha o evento com outros dois apresentadores.”
Este é um fragmento de uma mensagem que me fez pensar muito sobre escrever a respeito desse assunto aqui neste espaço. A discussão econômica em torno da necessidade de remuneração do trabalho intelectual às vezes parece dada, mas ao me deparar com tal mensagem penso que ainda precisamos aprofundar no assunto.
Discutir diariamente algumas pautas nos faz por vezes esquecer que boa parte da sociedade fora da nossa bolha ainda não está ambientada com uma série de discussões. Mas aqui não quero falar sobre a falta de informação ou de ambientes para discussões de pautas sociais, quero falar sobre DESONESTIDADE INTELECTUAL.
Este não será, e nunca vai ser o último convite que recebo para participar de projetos/palestras/cursos gratuitamente, a questão aqui é de onde esses convites continuam vindo. O meu trabalho também é sobre saber diferenciar para quem, e onde semeio meus conhecimentos.
A resposta a este convite que veio de uma instituição pública foi questionar o caráter voluntário da participação, visto que era um evento sobre qualificação profissional. Estou o tempo todo reafirmando a importância da remuneração de um trabalho intelectual que desenvolvo para os meus, e não a favor de uma elite branca heteropatriarcal, e mesmo assim continuam querendo nos pagar com VISIBILIDADE.
O neoliberalismo se apropria de pautas e utiliza um discurso dito “empoderador” onde se coloca mais uma vez como “brancos salvadores de povos não civilizados”. Ao nos oferecer espelhos, os colonizadores travestidos de donos das oportunidades, esperam que agradeçamos altivos pelo presente. Joice Berth¹ (2018) nos alerta sobre o uso equivocado do conceito de empoderamento. Este que é fruto de uma transformação social profunda, que tem relação e compromisso com a luta por emancipação e extermínio das desigualdades. E com certeza o neoliberalismo facista que vivemos no Brasil, de longe é “empoderador”.
Aprendo diariamente com as epistemologias de mamãe Oxum, que o Ababê (espelho) reflete como escudo, confiança e auto amor, assim não estou incompleta a ponto de me permitir submeter ao outro (nem a tais convites). Me completo vendo minha imagem refletida, e assim, com elegância e gentileza fruto do mais puro amor regado de lutas contra injustiças, consigo e sou fonte de poder e transformação.
Sendo essa fonte de transformação e amor, filtro todos os convites que chegam a mim, não preciso que reafirmem com palavras bonitas o quanto minha fala e presença são importantes. A DESONESTIDADE INTELECTUAL habita este lugar, onde pessoas querem nos pagar com VISIBILIDADE, usando nossas pautas para nos convencer que ao fazer trabalhos gratuitamente temos comprometimento com o social.
Sabe quando eu tenho comprometimento com o social? Quando não aceito mais participar de certas atividades gratuitamente, quando eu sei discernir onde minha presença deve ou não ser remunerada, quando com a elegância de mamãe Oxum consigo negar uma participação gratuita em um grande evento.
Visibilidade nunca pagou contas, todes sabemos disso! Mas continuam sendo DESONESTOS querendo nos convencer que nesta “oportunidade” a remuneração não existe porque “querem nos pagar, mas não possuem orçamento”, mas que os que vão assistir a participação futuramente “podem” nos contratar.
O mesmo acesso à universidade e lugares que me fazem ser importante nesses locais, também me muniu de diversas estratégias para que este tipo de discurso não me afete mais.
Conhece ou é uma organização social que tem verdadeiro compromisso com a agenda e com a comunidade, mas que não pode remunerar no momento? ME CHAMEM, que farei o possível para contribuir com meus conhecimentos, experiências e afeto.
Caso não seja o seu caso, poupe suas energias com convites brilhantes que mais parecem “espelhinhos de colonizadores”, o NÃO é certeiro. Para bancar minha vida de Preta Patrícia Favelada, além de grana, eu preciso acreditar no que faço, e eu NÃO acredito em vocês.
No mais, mandem jobs que façam meus olhos brilharem como o ouro de Oxum. Emito nota fiscal, okay?!
Até logo menos!
¹BERTH, J. O que é empoderamento?. Belo Horizonte: Letramento, 2018.
Muito boa a colocação
Que graça… que texto !!! amei !! E de fato … não dá pra pagar contas com visibilidade …linda. Brilhe. E Inshalá. 🤩