Quando o luto bate à porta e você não quer atender, o que fazer?
- gritaprojeto
- 13 de out. de 2021
- 4 min de leitura
Por Nina Otaviano

Há um mês eu me vi em estado de completo choque e descrença ao ouvir das minhas tias, pelo telefone, que a minha avó paterna, com quem eu tive a oportunidade de conviver longos vinte dois anos de vida, tinha falecido devido a insuficiência renal causada pela diabetes. O choque foi tão grande que eu não consegui me mover, ou até mesmo compreender que a palavra morte ou falecimento poderia (e está) estar associada a uma pessoa que era tão viva na minha história. E apesar de eu não acreditar na morte como o final de tudo, afinal, por ser espírita compreendo que a verdadeira vida é a espiritual sendo a experiência da encarnação passageira, ainda assim o luto me pegou em cheio, da mesma forma que aquela visita te assusta quando aparece na sua casa sem avisar e sua casa está um caos com o adendo de você ainda estar de pijama, mas muito pior, é claro. Eu simplesmente sentia como se eu tivesse sido jogada em alto mar sem nenhuma possibilidade de ancoragem a vista. E foi completamente assustador.
Eu sei que há dois anos, milhares de brasileiros têm passado por esse mesmo processo. O luto se tornou, infelizmente, aquela visita indesejada, incrivelmente dolorosa e invasiva por conta da pandemia de COVID-19 (e da constante negligência estatal). Por conta disso, durante todo esse tempo de pandemia, curiosamente, eu li muito sobre o luto e seus cinco estágios (negação, raiva, barganha, desespero e aceitação) , por um lado porque eu sou estudante de psicologia e este tema realmente é algo do meu campo de interesse, mas também porque eu pensava que saber tudo aquilo um dia me prepararia para algo que é inevitável na vida de qualquer ser humano, mas pasmem, o ditado “Só sabe quem passa” é uma lei quando falamos de luto, nada daquilo realmente me preparou para a intensidade da perda.
O falecimento da minha avó me mostrou que o luto é um processo que não obedece às regras, estágios ou normas gramaticais, o luto é um processo único, solitário e tão forte que tem a capacidade de destruir ou fazer renascer um ser humano. Às vezes é muito difícil de pôr em palavras o que estamos sentindo, e realmente isso causa uma angústia imensa, e às vezes você acha completamente injusto que o mundo também não parou para se despedir e ficar triste pela partida daquela sua pessoa amada, e isso também é extremamente doloroso, eu sei. O luto é um processo de completa catarse,
chega a ser perturbador, é como se você estivesse vivendo um constante terremoto que tenta abalar suas certezas sobre a vida. E eu aprendi que é preciso viver cada um desses momentos, sensações e até mesmo os prantos que vão aparecer de repente, pois eles são parte do processo e também são parte de você, viver tudo isso se tornou para mim o ato de receber a visita inesperada e dizer: Olha, não repara na bagunça tá? Mas pode entrar, a casa é sua! Quer um café?
Às vezes nós tentamos nos prevenir de tantas experiências, tentamos controlar os acontecimentos e até mesmo fazer como eu, que achei que ler sobre o luto me blindaria de me passar pelo processo com a mesma intensidade, mas a verdade é que a vida é imprevisível e os aprendizados partem de experiências que na maior parte das vezes nós não conseguimos controlar, como por exemplo a morte. Me lembro do dia que li no livro “Em busca de Sentido: Um psicólogo no campo de concentração”, de autoria do já falecido neuropsiquiatria e psicólogo Viktor Frankl, que a pergunta certa a se fazer não era “O que eu espero da vida?” mas sim “O que a vida espera de mim?” e aquilo me tocou profundamente, porque percebi que vivemos esperando que nossos planos para a vida sejam perfeitamente executados e que as experiências sejam até mesmo um pouco previsíveis e controláveis, mas a única verdade é que a vida é completamente mutável e imprevisível e o que vale mesmo é o que faremos com todas essas mudanças que fogem do nosso controle, e no meu caso, após a morte da minha avó, entendi que a pergunta que eu precisava fazer era “ O que o luto espera de mim?” e não “O que eu espero do luto?”
É importante vivenciar tudo aquilo que o luto vai te oferecer, mas é claro, se possível procure ajuda psicológica para evitar complicações e para que com a ajuda de um profissional você tenha subterfúgios para elaborar adequadamente o processo. É somente passando por esse processo que você vai conseguir encontrar, mesmo que demore, ou agora pareça impossível, um sentido não somente para a morte daquela pessoa amada, mas também para sua vida que mudou após aquela partida. É imprescindível que possamos falar também com mais naturalidade sobre a morte, pois ela, na verdade, é o que dá sentido para a vida (Sim, eu adoro o Viktor Frankl e estou citando novamente um princípio da logoterapia rs), e também compreender que mesmo que psicologicamente falando, as pessoas que verdadeiramente marcaram as nossas
vidas nunca morrem, pois seus ensinamentos, sejam eles negativos ou positivos, fazem parte integralmente daquilo que somos hoje e portanto, ainda que você não acredite no sentido espiritual, a vida após a morte é uma certeza pois uma parte do outro ainda vive em você.
Para finalizar, queria recomendar a vocês, leitores, a animação “Viva – A vida é uma festa” da Pixar, pois esse filme ganhou um significado extremamente importante para mim durante o meu processo de luto, porque ele me mostrou que sim, existe vida após a morte para aqueles que são lembrados e que é sempre possível ressignificar os percalços da vida fazendo com que sejamos protagonistas da nossa jornada, e também que a vida continua, tanto para os vivos, quanto para aqueles que já se foram, “linda e bela como sempre foi” (Opa, agora citei São Francisco, eita quantas referências! Haha).
Por hoje é só! Axé meu povo! Obrigada por me acompanharem até aqui, e até a próxima.
Texto incrível!! Necessário nesse momento que vivemos