Representatividade negra na literatura
- gritaprojeto
- 27 de jul. de 2021
- 3 min de leitura
Atualizado: 6 de set. de 2021
por Aretha Soyombo

Acredito que muita gente que está lendo esse texto ainda não me conhece, então vou me apresentar brevemente: meu nome é Aretha Soyombo, eu tenho 25 anos e amo r&b e literatura. Mas como minha relação com o R&B e com a literatura começou? E porque esses dois tópicos são tão importantes para mim?
Eu nasci no final dos anos 1990, (descobri recentemente que sou cringe rsrsrsr) então naquela época quase não tinha representatividade negra no ambiente que eu vivia, muito menos na mídia, por exemplo. Muito é discutido sobre a solidão da mulher negra, e sempre esse termo é associado a solidão afetiva com o fato de ter ou não um parceiro/parceira afetiva. (Isso é tema para outro texto). No entanto, desde criança; eu já vivia essa solidão por ser a única nos ambientes que eu frequentava, então a busca por representatividade sempre existiu.
Minha relação com o R&B pode ser tema para outro texto também até porque há muitos pontos que podem ser levantados em relação a esse assunto, então hoje vamos focar na literatura. Eu sou filha de bibliotecária, então minha mãe sempre incentivou a leitura. Eu não gostava muito, e o primeiro livro “de verdade” (leia-se: grosso) que eu li foi “O jardim Secreto”. Eu amei esse livro, e amo até hoje. Enfim, depois disso, me apeguei a algumas sagas tais como Poderosa do autor brasileiro Sergio Klein e todos os livros da Meg Cabot. Na minha época de adolescência, por ser muito “solitária” e ter sofrido uma certa exclusão no colégio onde eu estudava, os livros eram meus companheiros então eu lia MUITO. Porém, todos os livros eram protagonizados por personagens brancas, os personagens principais e coadjuvantes eram sempre brancos; com olhos claros; ou seja, nada a ver comigo. Aos 17 anos, senti que não sabia muito qual gênero literário que gostava e ao invés de ler livros infanto-juvenis, passei a ler o gênero “chick-lit”, que eu ainda gosto, mas também não me identificava tanto com as personagens.
Em 2013 eu comecei a faculdade de Letras com foco em tradução, mas meu amor pela literatura foi aumentando tanto que eu troquei a minha habilitação e fui para a Literatura. E foi quando eu mudei de habilitação, tendo mais contato com as literaturas da faculdade que os meus questionamentos começaram. Por mais que exista uma busca pela representatividade feminina no meio literário, quando a gente para e analisa as autoras literárias de grande sucesso no Brasil, a grande maioria, é formada por mulheres brancas. Elas contam suas vivências enquanto mulheres, mas muitas experiências eu não vivo até porque não sou branca então, “eu não sou uma mulher?”, já dizia Sojourner Truth.
Até que em 2015, eu já tinha 19 anos, já estava há dois anos na faculdade de Letras e li Americanah, livro da Chimamanda Ngozi Adichie. Autora conterrânea do meu pai. Foi com Americanah que minha vida mudou. Eu não conseguia parar de ler aquele livro com mais de 500 páginas, eu me via, me vejo, completamente na Ifemelu. Uma jovem negra, em diáspora, universitária, sendo retratada sem ser estereotipada... E o sentimento de identificação ao ler aquele romance foi tão bom, tão diferente poder ler um livro e imaginar pessoas como eu sendo os protagonistas daquela história, vivendo experiências que eu já tinha vivido e que ainda vivia. Hoje, Americanah não é meu livro favorito da Chimamanda, mas é o que fez a minha “chave virar”. E por isso ele tem um lugar muito especial no meu coração.
Em 2016, eu fiz uma matéria na faculdade que se chamava “Women’s Writing”, que podemos traduzir como “escrita feminina” e nessa matéria, durante um semestre inteiro, só vimos 3 autoras não brancas. Naquela época eu pensava que não era possível só ter tido 3 autoras não brancas durante todo aquele período estudado. E foi a partir dessa matéria, que eu busquei conhecer mais autoras negras. Como eu fiz Letras inglês na faculdade, eu sempre precisava estudar literaturas de língua inglesa então meu foco maior sempre foi em literaturas afro-americanas e nigerianas. Literatura nigeriana muito também por conta da minha família paterna. Foi com a ajuda do meu orientador também que eu conheci cada vez mais autores negros. Eu fiz minha monografia sobre a representação e os estereótipos de mulheres negras nas literaturas afro-americanas. Muito da minha escolha se deu para poder analisar e ver como nossa história é contada a partir das nossas palavras, vivências e realidade. E não pelo olhar do outro.
Hoje, eu tento sempre mostrar nas minhas redes sociais livros de autores negros que eu leio, que eu conheço. Porque do mesmo jeito que Americanah mudou a minha vida e a minha relação com a literatura aos 19 anos, eu espero que consiga fazer com que mais pessoas tenham essa experiência com autoras e autores que nos fazem “sair da caixinha” e conhecer novas realidades, novas culturas, novas vivências.
Aretha, que delícia ler seu texto. Franco, direto e sensível . Sinto em suas palavras que as experiências negativas fizeram-na uma mulher forte, daquelas que voam alto e levam consigo outras tantas mulheres. Viva a mulher negra, linda e inteligente que inspira a todas nós , brancas também. Estarei na fila pra pegar o autógrafo do seu primeiro livro. Sei que vai sair! ❤️🚀 🌍
Eu sou suspeitíssima ( sou a bibliotecária citada ) mas fico maravilhada com a fluidez do texto da Aretha … deliciosamente franco, retoma pontos doloridos , mas com a sensação de que aquilo te machucou, mas cicatrizou… gostoso de ler ..ao infinito e além ✈️😍
eu amei, me sinto representada em todo O texto. Que bom ver a escrita da Aretha por aqui. E vamos pela disseminação da literatura negra, mudou minha vida!
Texto incrível! Muito importante pensar na representatividade dentro da literatura! Adoro a escrita da Aretha❤️
Muito feliz pelo seu novo projeto, Aretha! E que bom vai ser poder conhecer um pouco mais sobre vocês pelos seus textos. Conheci a Chimamanda na faculdade também, quando um dos professores nos pediu a leitura do "Sejamos todos feministas". Sua história com "Americanah" me deixou curiosa para ler o livro 😊